Leo Middea, músico carioca radicado em Lisboa, ilumina toda a gente com novo álbum. Texto: Keissy Carvelli Com o recém-lançado Gente (2023), o músico carioca Leo Middea aposta na percussão e na mistura fina com elementos eletrônicos. Gravado em diversas cidades da Europa, entre elas a Praia da Areia Branca, em Portugal, o álbum tem alcançado um público vasto em digressão pela Europa. Em sua passagem por Coimbra, em palco ao centro do Largo do Poço em pleno verão de julho, Leo Middea mostrou a força de suas canções, embalando um público composto por aqueles que já o conheciam de outros carnavais – sobretudo de suas participações no Festival Avante – e aqueles que se renderam pela primeira vez aos encantos de suas canções. Em uma conversa descontraída logo após o apogeu em pleno Largo do Poço, Leo falou com a Rádio Pessoas sobre a criação do novo álbum, sobre suas influências e os planos para o futuro. Rádio Pessoas: Você acaba de lançar Gente, disco que vem com uma sonoridade muito própria, cheia de percussões, muito diferente dos discos anteriores em que há uma levada mais de samba canção. Você percebe essas diferenças? Leo Middea: Os meus discos foram mudando muito, a própria construção deles foi mudando. O disco Dois (2014) tem uma vibe muito intimista, traz uma certa timidez da minha parte, porque eu estava gravando com 16, 17 anos, no Rio de Janeiro, e eu não acreditava que eu tinha um potencial para aquilo. E aí gravei o disco e de repente meus amigos começaram a gostar e a partir daí, da minha autoconfiança que foi se criando através também dos meus amigos, eu tive a coragem de fazer meu segundo disco, Dança do mundo (2016), já em São Paulo, com uma outra estrutura e uma condição muito mais evidente, puxando mais a música brasileira. Tudo isso foi crescendo até chegar nesse Gente que é percussão, é instrumento é aquela coisa toda. RP: Esse processo foi natural ou você foi buscando esse tipo de sonoridade que ouvimos em Gente? LM: Foi supernatural, principalmente os aspectos do disco Gente que se diferencia dos outros discos, como os elementos eletrônicos que existem. É algo que eu queria explorar, uma coisa nova. Eu sempre tive uma referência de uma coisa nostálgica. Mas depois que eu assisti a uma entrevista do Gilberto Gil dizendo que a seta do tempo é para frente eu pensei que tenho de me adaptar ao que está acontecendo hoje, com as minhas referências do passado, mas sem tentar imitar algo que já aconteceu. RP: Numa das músicas do disco Gente você cita uma série de influências suas, como Jorge Mautner, Jorge Ben, Novos Baianos. Como você se relaciona com essas influências, com a história da música brasileira e como você lida com a questão de ter de fazer algo novo depois de tudo o que já foi feito por esses grandes músicos? LM: Sempre bate um pouco essa questão, mas acho que a base é entender que cada pessoa é um ser humano específico e por mais que possa soar igual, sempre será diferente. Cada pessoa vai compor de uma forma diferente, com uma visão diferente. Mas a ansiedade sempre vai tomar conta. Óbvio que já passou pela minha cabeça coisas como «porque eu estou fazendo isso aqui, se já existe?», mas pensando que cada individualidade é uma, uma coisa específica, acabo confiando mais no que vai acontecer e no meu próprio taco. RP: E como surge o ímpeto para um novo disco? LM: Eu sou uma pessoa que adora fazer disco, gosto muito do processo de discos. Não é à toa que tenho cinco discos em dez anos. Componho muito e sempre gosto mais das músicas atuais porque conversam mais com meu momento. Então, quando estava produzindo o disco Gente, por exemplo, demorou quase dois anos para ficar pronto, nesse período eu já compus imensas canções. Então, estou num momento de começar a pensar num próximo disco. Estou num momento de criação, de produzir, de compor e criar parcerias, de gravar. Acabo de lançar o Gente, mas já quero fazer outro. RP: Já tem ideia para o próximo?
LM: Já tenho várias ideias, uma das ideias principais que quero fazer para o ano que vem é um disco ao vivo em Portugal, voz e violão, cantando músicas de toda a minha carreira como uma forma de celebrar esses dez anos de carreira, mas é um disco que não vai ter propriamente inéditas, é mais algo de celebração mesmo. RP: Como é tua relação com Portugal? Já vive cá muito tempo? LM: Eu vivo há seis anos em Portugal, agora esse ano é um ano que tem rolado muitos shows com muitas partes diferentes, então eu tenho aproveitado muito essa onda. RP: Como é transitar entre o público brasileiro e o português? LM: Fazer concerto tanto aqui em Portugal quanto na Europa é diferente. Porque o Brasil é um lugar onde eu cresci vendo concertos e entendo mais a dinâmica. Mas quando eu chego em Portugal e viajo para a Europa, para mim é uma escola. Acho que é uma escola de como lidar com diferentes públicos de diferentes formas. Poder viajar de norte a sul de Portugal me traz essa sensação de poder aprender um pouco como fazer um concerto para públicos de diferentes aspectos. Eu gosto muito. RP: Tem alguma referência da música portuguesa no seu trabalho? LM: Com certeza, porque morando aqui é impossível não ter essa referência. A música é uma fotografia do que a gente vive, então se eu estou aqui em Portugal, tudo vai me influenciar, as músicas que eu escuto na rádio, com os amigos, ou com artistas que vou conhecendo nos concertos que dou, quantas praias, quantas ruas, é inevitável. RP: O que tem tocado no teu Spotify? LM: Eu conheci um músico em Paris, um argentino chamado Ignácio Maria, eu tenho escutado muito o disco dele chamado Belesia. Não só ele, mas o Zé Ibarra também, gosto muito dele. A gente se encontrou pouquíssimas vezes nessa vida, mas ele é um artista da nova geração que me encanta muito, que bate muito profundamente. E ele está no meu Spotify com certeza. RP: Você tem o costume de ouvir um álbum completo? LM: Eu gosto muito de escutar disco inteiro, hoje o tempo presente é muito ligado ao single... RP: Mas você lançou um disco... LM: É, eu lancei um disco. Nesse sentido, eu não consigo sair disso. Tem essa coisa da seta do tempo ser pra frente, mas essa ideia de álbum eu gosto muito. Eu acho muito mais bonito quando a música conta uma história e uma dinâmica, e acho que o álbum a gente consegue fazer com que seja algo mais completo. Por exemplo, como você vai fazer um filme e postar só uma cena? Como é que você vai entender o filme inteiro? Acho que para mim isso faz muito sentido, e quando é um artista que admiro muito, quando o single me abala muito, eu tento ver se tem um disco e aí escuto mesmo em looping. RP: E como você definiria a tua linguagem musical? Quem é Leo Middea? LM: Engraçado, eu não consigo me sentir no lugar de saber qual é a minha linguagem, porque é algo muito natural meu. Mas esses dias um produtor cultural veio falar comigo «pô, Leo, sua linguagem é muito específica, e é nítida em tudo seu». E eu disse, «é mesmo? Tem alguma coisa? ». Porque eu só tento ser espontâneo, tento ser eu, tento usar o meu gosto a tudo o que eu faço, meu gosto para as músicas, meu gosto para criar uma capa, o meu gosto para fazer uma postagem, então, tudo é o meu gosto que eu coloco ali, quero que seja o meu gosto. Acho que essa minha interação direta do que eu sou para o que eu faço talvez crie uma linguagem de mim próprio, da minha individualidade.
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